15.03.21 | Tamara Brant Bambirra, Deilton Ribeiro Brasil

ACESSO À JUSTIÇA PELOS GRUPOS VULNERÁVEIS EM TEMPOS DE PANDEMIA: UM DIREITO EM CRISE

O acesso à justiça é o meio pelo qual a sociedade brasileira busca pelos seus direitos, apesar de ser um direito fundamental, ou seja, inerente ao ser humano, é notório a dificuldade para sua efetivação, havendo uma grande discrepância em relação aos grupos vulneráveis.

A pandemia COVID-19, é um problema global causado por um vírus, suas consequências com tudo vão muito além das questões de saúde. Uma delas está relacionada ao acesso à justiça, sendo necessário analisar essa expressão em seu sentido mais largo, é dizer, ao acesso aos direitos e a um tratamento justo, com igualdade fática (GONÇALVES FILHO, ROCHA: MAIA, 2020, p. 47).

Os procedimentos metodológicos deste trabalho são baseados em pesquisas documentais, doutrinárias e de revisões bibliográficas, visando demonstrar como o efetivo acesso à justiça, por esses grupos, se agravou ainda mais na pandemia, uma vez que não conseguem ter acesso a um serviço que se tornou virtual. Foi utilizado o método descritivo-analítico para uma melhor reflexão sobre o tema central da presente pesquisa.

A definição e efetivação de direitos e de cidadania ainda encontram um espaço um tanto quanto insuficiente e relativamente pequeno na nossa sociedade, é notório que existe um desprezo e um abandono pelas pessoas e comunidades vulnerabilizadas.

A Global Access to Justice Project, através de dados coletados em mais de 51 países, na qual buscou responder quais os impactos que a Covid-19 vem surtindo no acesso global à Justiça, objetivando assim esclarecer como o acesso das pessoas à justiça foi afetado em tempos de pandemia. Verificou-se que a maioria dos países deixaram de adotar medidas para conter os impactos desproporcionais suportados por grupos vulneráveis (GLOBAL ACCESS TO JUSTICE PROJECT, 2020).

A Constituição Federal de 1988 prevê o acesso à justiça como um direito fundamental pautado na dignidade da pessoa humana e na igualdade, uma vez que sem um efetivo acesso à justiça os demais direitos se tornam ilusórios.

Para a efetividade de todos os direitos, sejam eles individuais ou supra-individuais, de primeira, de segunda ou de terceira geração, o acesso à justiça é requisito fundamental. Os direitos só se concretizam se for real a possibilidade de reclamá-los perante tribunais imparciais e independentes. Assim, a questão do acesso à justiça é primordial para a efetivação de direitos. Consequentemente, o seu impedimento provoca limitações ou até mesmo impossibilita a efetivação da cidadania (ROQUE, 2017).

Destaca-se também a pesquisa feita pela Fundação Getúlio Vargas, que foi realizada em Defensorias Públicas de todo o país, e apontou que o acesso à justiça por grupos vulneráveis está sendo afetado em tempos de pandemia, sendo esta a percepção de 92,6% dos profissionais que participaram da pesquisa (BOCCHINI, 2020).

O relator especial da ONU, Diego García-Sayán, e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, fizeram um chamado aos Estados, para que como uma das medidas adotadas para conter a pandemia, seja garantido o amplo acesso à justiça, uma vez que este é meio fundamental para proteger e promover os direitos humanos e as liberdades fundamentais. Destacaram que o acesso à justiça é um pilar essencial para o Estado de Direito, e observaram que o uso de meios tecnológicos na prestação de serviços de justiça teve um impacto negativo em algumas situações no acesso à justiça de alguns setores da população em decorrência da desigualdade digital existente, já que o uso de tais meios pressupõe o acesso a meios eletrônicos e ao conhecimento tecnológico para acessar os serviços da justiça. Alertaram ainda que existe uma falta de cobertura em várias partes do território dos Estados, o que agrava ainda mais a desigualdade digital (OEA, 2021).

Podemos constatar através deste trabalho que não está sendo proporcionado o efetivo acesso à justiça aos grupos vulnerabilizados, resultando assim em uma grande adversidade para o desenvolvimento do Estado Democrático de Direito. O acesso à justiça não pode ser negligenciado, este deve ser garantido e proporcionado a toda sociedade brasileira, precisando ser urgentemente amplamente efetivado.

A dificuldade de diversos grupos vulneráveis em ter um amplo acesso à justiça está diretamente relacionada com a desigualdade, sendo assim podemos constatar que no Brasil a exclusão e a desigualdade estão diretamente ligadas.

O acesso à justiça deve ser pluralista, sendo necessário que, principalmente em tempos de pandemia, se tomem medidas para reduzir a desigualdade digital. Devendo ser garantido aos grupos que se encontram em situação de vulnerabilidade o efetivo acesso aos serviços de justiça.

REFERÊNCIAS

BOCCHINI, Bruno. Pandemia afastou vulneráveis do acesso à Justiça, revela pesquisa. Agência Brasil, 2020. Disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2020-08/pandemia-afastou-vulneraveis-do-acesso-justica-revela-pesquisa. Acesso em: 10 mar. 2021.

GLOBAL ACCESS TO JUSTICE PROJECT. Impacts of COVID-19 on Justice Systems, 2020, Disponível em: http://globalaccesstojustice.com/project-overview/. Acesso em: 10 mar. 2021.

GONÇALVES FILHO, Edilson Santana : ROCHA, Jorge Bheron, MAIA, Maurilio Casas. In: TARTUCE, Fernando: DIAS, Luciano Souto [org.] Defensoria Pública e acesso à justiça na pandemia coronavírus. Coronavírus direitos dos cidadãos e acesso à justiça. Idaiatuba: Editora Foco, 2020.

ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Declaração conjunta sobre o acesso à justiça no contexto da pandemia de COVID-19, 2021. Disponível em: http://www.oas.org/pt/cidh/jsForm/?File=/pt/cidh/prensa/notas/2021/015.asp. Acesso em: 10 mar. 2021.

ROQUE, Nathaly Campitelli. Acesso à Justiça. Enciclopédia jurídica da PUC-SP, 1. ed, São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: http://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/105/edicao-1/acesso-a-justica. Acesso em: 10 mar. 2021.

[1] Tamara Brant Bambirra - Mestranda do PPGD – Mestrado e Doutorado em Proteção dos Direitos Fundamentais da Universidade de Itaúna-MG. Pós-graduada em direito público e privado. Bacharel em Direito pela Faculdade Dom Hélder Câmara (ESDHC).

[2] Deilton Ribeiro Brasil - Pós-Doutor em Direito pela UNIME, Itália. Doutor em Direito pela UGF-RJ. Professor da Graduação e do PPGD - Mestrado e Doutorado em Proteção dos Direitos Fundamentais da Universidade de Itaúna (UIT), Faculdades Santo Agostinho (FASASETE-AFYA), Faculdade de Direito de Conselheiro Lafaiete (FDCL). Professor visitante da Universidade de Caxias do Sul (UCS).


BAMBIRRA, Tamara Brant Bambirra; BRASIL, Deilton Ribeiro Brasil. ACESSO À JUSTIÇA PELOS GRUPOS VULNERÁVEIS EM TEMPOS DE PANDEMIA: UM DIREITO EM CRISE. Revista Páginas de Direito, Porto Alegre, ano 21, nº 1485, 15 de Março de 2021. Disponível em: https://paginasdedireito.com.br/artigos/todos-os-artigos/acesso-a-justica-pelos-grupos-vulneraveis-em-tempos-de-pandemia-um-direito-em-crise.html
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Editores: 
José Maria Tesheiner
(Prof. Dir. Proc. Civil PUC-RS Aposentado)

Mariângela Guerreiro Milhoranza da Rocha

Advogada e Professora Universitária

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