30.05.01 | José Maria Rosa Tesheiner

Falsidade de assinatura - ônus da prova

Afirmou o Tribunal de Alçada de Minas Gerais: 'A norma adjetiva prescreve que o ônus da prova, quando se tratar de contestação de assinatura, cabe à parte que produziu o documento. Contudo, se o signatário argüir a falsidade do documento, a ele compete a prova e, em assim sendo, tratando-se de prova pericial, incumbe-lhe antecipar as despesas, inclusive honorários de perito' (TAMG, Sexta Câmara Cível, Apelação Cível 323.262-4, Belizário de Lacerda, relator, j. 13.11.2000).

A afirmação beira o absurdo. É verdade que, contestada a assinatura, o ônus da prova incumbe à parte que produziu o documento (CPC, art. 389, II), isto é, à parte que o apresentou em juízo. Mas é claro que a parte adversa não poderá contestar a assinatura senão argüindo a falsidade do documento. Por isso mesmo, a argüição de falsidade, quer feita na contestação, quer na inicial de ação incidental, não acarreta inversão do ônus da prova, que continua a cargo de quem apresentou o documento em juízo. Nem cabe, em casos tais, falar-se em 'signatário', pois a dúvida recai sobre quem assinou o documento, ignorando-se, pois, quem seja o signatário.

Ensina Moacyr Amaral Santos: 'A fé do documento particular cessa 'quando lhe for contestada a assinatura e enquanto não se lhe comprovar a veracidade' (art. 388, n. I). De tal modo, contestada a assinatura do documento, para que sua fé se restabeleça, cumpre àquele que dele quiser valer-se como prova demonstrar a sua veracidade pelos meios ordinários de prova, especialmente por perícia. O ônus da prova da veracidade recai sobre o impugnado (art. 389, n. II). É o que se chama verificação de assinatura, sobre o que o juiz decidirá na sentença que proferir no processo em que se produziu o documento. Desse modo, o impugnante da assinatura não terá necessidade de utilizar-se da argüição de falsidade, porque o impugnado não poderá valer-se do documento se não provar a sua veracidade' (Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro, Forense, 1976. v. IV, p. 233).

É provável que, por outras razões, haja, no mérito, sido correta a decisão do acórdão. É certo, contudo, que a doutrina nele consagrada facilita demais a ação dos falsificadores. Apresentado o documento em juízo, incumbiria ao réu antecipar as despesas com perícia destinada a comprovar não ser sua a assinatura nele lançada. E o que é pior: presumindo-se a autenticidade da assinatura, em caso de dúvida...

 

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. INCIDENTE DE FALSIDADE. PROCESSO JULGADO EXTINTO. PROVA PERICIAL. :ONUS PROBANDI DA PARTE QUE REQUEREU. NULIDADE INEXISTENTE. PROCESSO VÁLIDO.

Não há de se falar em cerceamento de defesa : quando, impugnada a veracidade da assinatura de documento, : a parte signatária do mesmo argüi o competente procedimento de incidente de falsidade, a final : julgado extinto, se essa não se desincumbe do :onus probandi depositando os honorários periciais para que a perícia possa ser realizada.

Obedecido o consagrado direito constitucional de plenitude de defesa, inexistente é a nulidade alegada sob este fundamento.

A : C : Ó : R : D : à: O

Vistos, relatados e discutidos estes autos de :Apelação Cível nº 323.262-4, da Comarca de :BELO HORIZONTE, sendo Apelante (s):FERNANDA DE LIMA RIBEIRO PENNA e Apelado (a) (os) (as):BANCO ABN AMRO S.A., SUCESSOR DA CIA. AYMORÉ DE CRÉDITO, INVESTIMENTO E FINANCIAMENTO,

ACORDA, em Turma, a Sexta Câmara Civil do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais :REJEITAR A PRELIMINAR E : NEGAR PROVIMENTO.

Presidiu o julgamento o Juiz :MACIEL PEREIRA e dele participaram os Juízes :BELIZÁRIO DE LACERDA (Relator), DÁRCIO LOPARDI MENDES (Revisor) e VALDEZ LEITE MACHADO (Vogal).

O voto proferido pelo Juiz Relator foi acompanhado na íntegra pelos demais componentes da Turma Julgadora.

Produziu sustentação oral pelo apelado o Dr. Osmando Almeida.

Belo Horizonte, 13 de novembro de 2000.

JUIZ BELIZÁRIO DE LACERDA

Relator

 

V : O : T : O

O SR. JUIZ : BELIZÁRIO DE LACERDA:

Conheço do recurso interposto por Fernanda de Lima Ribeiro Penna, visto que observados os requisitos legais à admissibilidade.

A apelante, em suas razões, insurge-se contra a r. decisão monocrática que julgou procedente a ação de depósito aviada contra ela pelo Banco ABN AMRO S.A., condenando-a a restituir o bem, que é um veículo, conforme descrito na exordial ou o pagamento do saldo contratual, sob pena de prisão. Sustenta a recorrente seja decretada a nulidade da r. sentença sob o fundamento de cerceamento de defesa, porque pugnou pela produção de provas, inclusive pericial, invocando o artigo 389, II do CPC, asseverando falsificação de sua assinatura em documento de financiamento, f. 5, verso, que lhe fez promover o competente incidente de falsidade, julgado extinto, todavia, tendo argumentado o MM. Juiz que a prova pretendida poderia ser produzida nos autos principais. Alega a requerente que cumpria ao banco/apelado arcar com o ônus desta prova, e que não quis suportá-la, inviabilizando sua necessária produção, contaminando, pois, todo o processo de nulidade absoluta, inclusive a r. sentença :a quo.

Em contra-razões, o apelado aduz que nenhuma razão assiste à requerente, em resumo, que o ônus da prova lhe cabia, uma vez que a alegação de falsidade do documento tratava-se de fato impeditivo e extintivo do direito alegado por ela, ré, ora apelante, consoante o contido no artigo 333, II do CPC, e, além do mais, outras provas foram carreadas aos autos, propiciando o convencimento do MM. Juiz monocrático, relevando ainda, que a apelante nem sequer preocupou-se em comparecer à audiência, quando poderia evidenciar o seu pedido, acrescendo também, que não foi negado o débito, muito menos a sua obrigação de entregar o bem, assim devendo prevalecer o teor da r. decisão na sua inteireza, não dando provimento ao recurso.

Em detido exame dos autos, verifico que a questão posta a recurso apelatório atém-se à prova pericial, insistindo a apelante pela sua necessária produção sob pena de nulidade.

Versa a causa sobre a pretensão do requerido em receber o bem (veículo), concedido à requerente em contrato de financiamento, celebrado em 21.8.1997, cujo término estava previsto para 21.8.1999, no qual não foram quitadas nenhuma das prestações pactuadas, ou como alternativa ser ressarcido no equivalente em dinheiro, devidamente corrigido, assim é o pedido e o determinado na r. decisão :a quo.

A ré, ora apelante, não contesta o débito nem a posse do bem (veículo), somente defende-se alegando que não fizera nenhum contrato de financiamento com o apelado, e que a assinatura aposta no referido documento é falsa, e assevera que o :onus probandi é do requerido, portanto nula é a sentença que desconsiderou tal argumento, cerceando-lhe a defesa, mesmo tendo argüido o incidente de falsidade, que foi julgado extinto.

O direito à plenitude de defesa é consagrado pela Carta da República configurando pela garantia processual em obediência às normas instrumentais adequadas à realização da prestação jurisdicional, segundo os imperativos da ordem jurídica.

A norma adjetiva prescreve que o ônus da prova, quando se tratar de contestação de assinatura, : cabe à parte que produziu o documento.

Contudo, se o signatário argüir a falsidade do documento, a ele compete a prova e, em assim sendo, tratando-se de prova pericial, incumbe-lhe antecipar as despesas, inclusive honorários do perito, logo, cabia à apelante assim proceder.

Nunca é demais afirmar que os princípios são mais importantes que as normas e constituem preceitos, que produzido que seja o documento, a assinatura nele adjunta presume-se autêntica e verdadeiras as declarações nele contidas, artigo 131 do CCB, presunção :juris tantum, que pode ser-lhe cessado a fé pela declaração judicial de falsidade, o que não ocorreu desta feita, cujo processo de incidente de falsidade intentado pela requerente foi julgado extinto, desnaturando a alegação de ter havido cerceamento de defesa.

Neste diapasão, devo conduzir-me a confirmar a r. sentença monocrática em seus próprios e jurídicos fundamentos e, por assim, negar provimento ao recurso, o que decido.

Custas :ex lege.

JUIZ BELIZÁRIO DE LACERDA

sap

http://www.direitoemminas.net/ (copiado em : 19.05.01)

 


TESHEINER, José Maria Rosa Tesheiner. Falsidade de assinatura - ônus da prova. Revista Páginas de Direito, Porto Alegre, ano 1, nº 36, 30 de Mai de 2001. Disponível em: https://paginasdedireito.com.br/artigos/todos-os-artigos/falsidade-de-assinatura-onus-da-prova.html
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Editores: 
José Maria Tesheiner
(Prof. Dir. Proc. Civil PUC-RS Aposentado)

Mariângela Guerreiro Milhoranza da Rocha

Advogada e Professora Universitária

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