O princípio da legalidade e a aplicação direta da Constituição
Nosso sistema jurídico assenta em duas idéias basilares: o princípio da legalidade e a superioridade da Constituição sobre as demais leis. O da legalidade está expresso no artigo 5o, II, da Constituição: 'ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei'. A superioridade da Constituição sobre as demais leis decorre sobretudo da doutrina constitucional. Não faria sentido uma lei afirmar sua superioridade sobre as demais, sobretudo as futuras. Pode-se, contudo, apontar na Constituição normas de aplicação desse princípio, como as que prevêem o controle concentrado e difuso da constitucionalidade das leis.
Cabe ao Judiciário a guarda da Constituição, estando, por isso mesmo, autorizado a desconsiderar toda norma infraconstitucional que a contrarie.
Essa doutrina surgiu nos Estados Unidos da América do Norte, citando-se como precursores, entre outros, Hamilton (The Federalist) e o juiz da Suprema Corte Marshal (caso Marbury :v. Madison, 1803).
As idéias, uma vez lançadas na corrente social, como que adquirem vida própria. Crescem, alastram-se, transformam-se e morrem.
Hoje, a Constituição já não é mais vista como um corpo de normas. É um corpo de princípios, de alcance ilimitado. E há não apenas princípios explícitos. Há também os implícitos, que são, em suma, aqueles que, na visão subjetiva dos intérpretes, nela objetivamente se encontram...
O Judiciário pode, não apenas declarar a inconstitucionalidade de uma lei, como aplicar diretamente as normas constitucionais e, sobretudo, os princípios constitucionais, pois (ensina-se) os princípios são mais importantes do que as regras.
Essa expansão prenuncia o fim do controle da constitucionalidade das leis, pelo menos sob a forma do controle difuso. É como uma estrela nova, cujo brilho intenso anuncia seu fim próximo.
O poder conferido aos juizes de aplicar diretamente a Constituição está em guerra com o princípio da legalidade. Eis aí os dois reagentes que irão provocar a explosão ou a corrosão do sistema.
O juiz que não obedece ao Príncipe que o nomeou, nem às leis votadas pelo Parlamento, decide como quer. Num extremo, o arbítrio do Chefe do Estado: no outro, o dos juizes, sem lei nem rei.
TESHEINER, José Maria Rosa Tesheiner. O princípio da legalidade e a aplicação direta da Constituição. Revista Páginas de Direito, Porto Alegre, ano 0, nº 11, 30 de Julho de 2000. Disponível em: https://paginasdedireito.com.br/artigos/todos-os-artigos/o-principio-da-legalidade-e-a-aplicacao-direta-da-constituicao.html