Episódio 59: Primeiras Linhas de Processo Civil. 16 – Da contrariedade
Texto:José Caetano Pereira e Sousa e José Tesheiner
Apresentação:Marcelo Bopp Tesheiner
Narração:José Tesheiner e Sophia Salerno Peres
Duração do episódio: 10 minutos e 41 segundos
Música:Julians Auftritt, de Christoph Pronegg, Klassik - Album 2008:Siciliana, de Schumann, por Marco Tezza
Edição de áudio:André Luís de Aguiar Tesheiner
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Comentários às Primeiras Linhas de José Joaquim Caetano Pereira e Sousa
Da contrariedade
Antes de iniciarmos nossa conversa de hoje com Joaquim José Caetano Pereira e Sousa, lembramos que, em março de 1817, eclodiu a chamada Revolução Pernambucana, também conhecida como Revolução dos Padres, na Província de Pernambuco.As ideias liberais que haviam entrado no Brasil junto com viajantes estrangeiros e livros incentivavam um sentimento de revolta entre a elite pernambucana, que participava ativamente, desde o fim do [século XVIII], de sociedades secretas, como as lojas maçônicas. Nelas reuniram-se intelectuais, religiosos e militares, para elaborar planos para a revolução.O levante ficou conhecido como 'revolução dos padres', dada a participação do clero católico, tendo Frei Caneca se tornado um símbolo.Uma de suas causas foi a criação de novos impostos por D. João VI.O movimento iniciou com a ocupação do Recife, em 6 de março de 1817 tendo sido liderado por Domingos José Martins, com o apoio de Antônio Carlos de Andrada e Silva e de Frei Caneca. Tendo dominado o Governo Provincial, os revoltosos apossaram-se do tesouro da província, instalaram um governo provisório e proclamaram a República.Uma assembléia constituinte decretou a separação dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário: proclamou a liberdade de imprensa e aboliu alguns impostos, Foi mantida a escravidão. O catolicismo foi mantido como religião oficial.Como marca de sua identidade própria, os padres pernambucanos passaram a usar, nas missas, aguardente, em lugar de vinho, e hóstia feita de mandioca, em vez de trigo. As tentativas de obter apoio das províncias vizinhas fracassaram. Na Bahia, o emissário da revolução, o Padre Roma, foi preso ao desembarcar e imediatamente fuzilado, por ordem do governador.Tropas enviadas da Bahia avançaram pelo sertão pernambucano, enquanto uma força naval, despachada do Rio de Janeiro, bloqueava o porto do Recife. Em poucos dias, 8000 homens cercavam a província. Em maio as tropas portuguesas entraram no Recife e encontraram a cidade abandonada e sem defesa. O governo provisório rendeu-se.Os revolucionários haviam ficado no poder menos de três meses.Foram proferidas sentenças severas. Ao todo, foram executados onze confederados, entre eles, Frei Caneca, este aos 13 de janeiro de 1825, diante dos muros do Forte Cinco Pontas. A província de Pernambuco foi desmembrada, criando-se as novas províncias de Rio Grande (do Norte) e de Alagoas.A atual bandeira de Pernambuco é a mesma que os revoltosos usaram em 1817.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Revolução_Pernambucanahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Frei_Caneca
Feita essa rememoração, ouçamos o que entrementes ensinava Pereira e Sousa a respeito da contrariedade.
A contrariedade é a refutação do libelo feita por artigos, na qual se conclui a absolvição do réu de todo, ou de parte do que se lhe pede.
Trata-se, aí, do que hoje se chama contestação, em que cabe ao réu apresentar a sua defesa, inclusive as exceções processuais, exceto as de incompetência, impedimento ou suspeição, que têm procedimento próprio. Observa Eduardo Arruda Alvim que todas as defesas devem ser apresentadas de uma só vez, em caráter alternativo ou subsidiário, de modo que não acolhida uma possa ser apreciada a outra (princípio da eventualidade). Ocorre preclusão relativamente à defesa não apresentada. (Dir. Proc. Civil, 3. ed, p. 392).
Ela é afirmativa, ou negativa. É afirmativa quando o Réu não nega a verdade do fato proposto no libelo, e só nega estar por ele obrigado. É negativa quando réu nega ser verdadeiro o fato que no libelo se deu em todo, ou em parte.Também se divide a contrariedade em geral, e especial. É geral quando o réu geralmente nega a intenção do Autor. É especial quando o réu responde a cada um dos artigos do libelo.A contrariedade, assim a afirmativa como a negativa deve ser articulada.
Há duas formas de defesa direta: a que nega as conseqüências jurídicas dos fatos constitutivos alegados pelo autor e a que nega a ocorrência dos próprios fatos afirmados pelo demandante.Na atualidade, não mais se admite contestação por negação geral. Nos termos do artigo 302 do Código vigente, cabe ao réu manifestar-se precisamente sobre os fatos narrados na petição inicial, presumindo-se verdadeiros os não impugnados. Não se exige, porém, que a contestação seja articulada.Nos termos do artigo 302 do Código vigente, cabe ao réu manifestar-se precisamente sobre os fatos narrados na petição inicial, presumindo-se verdadeiros os fatos não impugnados, salvo se inadmissível, a seu respeito, confissão: se a petic?a?o inicial na?o estiver acompanhada do instrumento pu?blico que a lei considerar da substa?ncia do ato: se estiverem em contradic?a?o com a defesa, considerada em seu conjunto. Estão isentos do ônus da impugnação especificada dos fatos o advogado dativo, o curador especial e o órgão do Ministério Público.
A contrariedade deve ser oferecida dentro do termo legal. Se o réu nesse termo não contraria, é lançado, e se prossegue na causa à sua revelia.
O prazo para o oferecimento da contrariedade era o de duas audiências (Ord. Livro III, Tit. 2, 21).Na atualidade, o prazo para oferecer contestação é, no procedimento ordinário, de 15 dias, contados da juntada aos autos do mandado de citação cumprido. A Fazenda Pública e o Ministério Público têm prazo em quádruplo para contestar. Havendo mais de um réu, com diferentes procuradores, o prazo é em dobro.
Vindo o réu com a sua contrariedade por escrito o Juiz lh’a recebe, e manda que se dê vista ao autor para replicar.
Na atualidade, o juiz somente deve dar vista ao autor para replicar se o réu houver alegado fato modificativo ou extintivo (CPC, art. 326). Não havendo necessidade de produção de provas para o esclarecimento de questão de fato, cabe julgamento imediato (julgamento conforme o estado do processo).O Código vigente adota o princípio da sucumbência, recaindo sobre o vencido o ônus das custas do processo e dos honorários do advogado do vencedor, independentemente de pedido do autor, na petição inicial, ou do réu, na contestação.No Direito justinianeu, ao libellus conventionis, apresentado pelo autor, o réu opunha o libellus contradictionis, admitindo ou rejeitando as pretensões do autor ou opondo exceções. (Scialoja, p. 375).No Direito federal norte-americano, a contestação recebe o nome de resposta (answer to the complaint), observando Richard Freer que ela requer considerável paciência e atenção, a ponto de advogados cuidadosos analisarem palavra por palavra a petição inicial, para ficarem seguros de que respondem adequadamente, negando ou, conforme o caso, admitindo ou afirmando falta de informação suficiente. (Freer, p. 315).Lembro-me de minha primeira contestação. Eu era ainda estudante. Era uma ação de despejo. Uma colega mais velha e mais experiente leu minha contestação e disse: Pronto! Já confessaste. Tens é que negar tudo. E inventar também umas benfeitorias, para alegar direito de retenção...Pois é. Retornemos a 1817, o ano da Revolução pernambucana. Em junho desse mesmo ano, o alemão Karl Friedrich Drais desfilava com sua mais recente invenção: uma bicicleta, de madeira, com duas rodas e dianteira dirigível. Como não tinha pedais, o ciclista tomava impulso apoiando os pés no chão. http://www.brasil.diplo.de/Vertretung/brasilien/pt/__pr/Nachrichten_20Archiv/12.06.13_20Invencao_20Bicicleta.html
Bibliografia
ALMEIDA, Fernando H. Mendes de. Ordenações Filipinas – Ordenações e leis do Reino de Portugal recopiladas por mandato Del Rei D. Filipe, o Primeiro. São Paulo: Saraiva, 1957.ALVIM, Eduardo Arruda. Direito Processual Civil. 3 . ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.FREER, Richard. Civil Procedure. 2. ed. USA: Aspen Publishers, 2006.SCIALOJA, Vittorio. Procedimiento Civil Romano. Trad. Santiago Sentis Melendo y Marino Ayerra Redin. Buenos Aires: Europa-América, 1954.SOUSA, Joaquim José Caetano Pereira e. Primeiras Linhas sobre o Processo Civil. Coimbra: Imprensa Literária, 1872.