24.11.07 | Carlos de Souza Gomes

Comentários aos arts. 768 a 773 do CPC - Da verificação e da classificação dos créditos

Art.768. Findo o prazo, a que se refere o nº II do art. 761, o escrivão, dentro de 5 (cinco) dias ordenará todas as declarações, atuando cada uma com o seu respectivo título. Em seguida intimará, por edital, todos os credores para, no prazo de 20 (vinte) dias, que lhes é comum, alegarem as suas preferências, bem como a nulidade, simulação, fraude, ou falsidade de dívidas e contratos.

Parágrafo único. No prazo, a que se refere este artigo, o devedor poderá impugnar quaisquer créditos.

 

 

Natureza jurídica do concurso e a sua evolução histórica

 

O surgimento da execução patrimonial teria nascido em Roma, por meio da denominada “pignoris capio”. Ação essa que teve origem no serviço militar, pois permitia ao soldado, para haver o soldo, empenhar o dinheiro do responsável pelo pagamento, no caso deste recusar-se a efetuá-lo (conforme Gayo, Institutas, IV, 26-29)1. Em outras palavras, esta ação material – pois na origem do direito romano não havia distinção entre direito material e processual – servia como um meio de coação a vontade do devedor inadimplente, a guisa do penhor. Diferentemente de como ocorre hodiernamente, posto que a ação executiva possui finalidade precípua de expropriação da coisa penhorada.

Sem se descuidar, de outro lado, que a satisfação da obrigação do devedor, no antigo direito romano, se processava por meio da :Iegis actio per manus injectionem2, ou seja, com a responsabilidade pessoal do devedor (morte ou escravidão). Mais tarde, abolida pela :Lex Poetelia, fortalecendo a figura do juiz que poderia imitir o credor na posse dos bens do devedor, por meio da :missio in bona rei servendae causa. E, por último, viu-se a :bonorum cessio, a qual impunha ao devedor romano o abandono de seus bens em favor do credor, no limite da dívida. Esta :bonorum cessio3 tinha por fim evitar a execução pessoal sobre o devedor e a imposição de infâmia, além de assegurar uma reserva de bens, adquiridos posteriormente ao abandono, do que fosse necessário para o devedor sobreviver. Ademais, no caso de haver concurso de credores, a solução para a satisfação dos credores estava regulada pelo :missio in possessionem bonorum, que consistia no direito de os credores permanecerem na posse dos bens do devedor, assim como aliena-los.

E a ação concursal não é incidental, mas o próprio processo de execução em sua fase de entrega do produto, como leciona Enrico Tullio Liebman4, seguido por Araken de Assis5. A idéia de ação incidental, ademais, decorria do direito de preferência – :prior tempore potior iure – concebida ainda no direito romano, sendo que cabia aos credores o produto da venda dos bens penhorados, adotado, posteriormente, pelo direito português.

De mencionar que no processo :extra ordinem6, conforme a lição de Liebman, existia a figura da execução especial ou singular (então incidental) com o :pignus in causa iudicati captum. Nesse procedimento, havendo mais de uma penhora sobre o mesmo bem, a solução da lide se dava pelo princípio da :prior tempore potior iure, isto é, o credor mais diligente (que procedia primeiro a penhora) acabava por se antecipar à liquidação do bem e garantia a satisfação do seu crédito. Enquanto isso, o credor retardatário ficava ao acaso de saldo excedente, se houvesse.

Essa solução executiva, para solver a questão de mais de uma penhora sobre o mesmo bem do devedor, se estendeu até meados do século XVII, onde passou a ser confrontado com o princípio da igualdade dos credores, ganhando relevo no Código Napoleônico, que estabeleceu o princípio da distribuição do produto dos bens do insolvente, segundo a :par contribution, sem prejuízo dos créditos privilégios legais7.

Na mesma esteira do direito romano, esteve o direito português, que adotou o princípio da :prior tempore potior iure(preferência da penhora) para solver o concurso de credores. Ao passo que esta solução sistemática, somente foi substituída pelo critério da :par conditio creditorum, definitivamente, sob a égide das Ordenações Filipinas (1.603), com a promulgação de uma lei portuguesa, datada de 22 de dezembro de 1.7618.

De referir que o critério da :par conditio creditorum, no dizer do Código Civil, art. 957, consiste em não havendo título legal à preferência, terão os credores igual direito sobre os bens do devedor comum, e igualizar, no caso de insolvência, significa fazer igual o prejuízo9.

Por isso a ressalva de Clóvis Bevilaqua, no sentido de que o imóvel hipotecário só poderia ser objeto de execução se promovida pelo credor hipotecário, excetuado pela hipótese de insolvência do devedor (CC, art. 849, VII), – no mesmo sentido, Liebman10: art. 609. § 1º do Regulamento 737 e CPC/39, art. 1.019 e CPC/73, art. 748.

Necessário destacar, ainda nesta introdução, que o crédito tributário consiste na única exceção ao concurso universal de credores. Isso porque a Fazenda Pública insubordina-se à execução coletiva, em face do quanto disposto no art. 187 do Código Tributário Nacional, no sentido de que a cobrança judicial do crédito tributário não está sujeita ao concurso de credores ou habilitação em falência, recuperação judicial, concordata, inventário ou arrolamento.

Ao final, após a declaração da insolvência11, e nomeado o administrador da massa, que geralmente é o maior dos credores, o juiz mandará expedir edital, convocando os credores para que apresentem, no prazo de vinte dias, a declaração do crédito, acompanhado do respectivo título (CPC, art. 761, II).

 

Doutrinas sobre o concurso de credores

 

A doutrina da comunhão :pro indiviso12, sustentada por Salgado de Somoza, ainda no direito medieval, consistia no fato de o patrimônio do devedor ser universal e divisório, de modo que o processo concursal pretendia extinguir a comunhão patrimonial, distribuindo, a cada um dos credores, a sua cota parte, nos mesmos termos do penhor instituído no direito privado. Alfredo Rocco também foi adepto desta teoria, de modo que entendia ser a execução forçada o próprio direito privado do credor, isto é, simplesmente a realização do direito do credor em vender os bens do devedor para o fim de conseguir a satisfação pelo preço.

A doutrina de Liebman13, conhecida como a entrega do produto, consistia em terminada a fase instrutória da execução com o ato de desapropriação em qualquer de suas formas, e substituídos os bens penhorados por dinheiro líquido, só resta entregá-lo ao exeqüente. Diferente será a solução da execução se houver mais de um credor. Neste caso, o concurso de credores não é incidente da execução: é o próprio processo de execução em sua fase final, quando se dá o caso de haver pluralidade de credores concorrentes. Em havendo insuficiência de bens livres do executado, nasce a pretensão da pluralidade de credores em instaurar uma execução coletiva ao efeito do provimento comum.

A teoria de Carnelutti14 foi encampada por Amílcar de Castro que a definiu como o direito ao quociente, ou seja, se não há bens suficientes para satisfazer integralmente a todos os credores, tinham eles o direito de receber uma parte de todo o patrimônio do devedor. De modo que a comunhão dos credores consiste no direito processual de cada credor receber uma parte do patrimônio do devedor, como se a sentença cindisse a lide em vários processos singulares quantos fossem os credores habilitados. Sem esquecer que Carnelutti sustentava que o concurso é processo executivo cumulativo, ao passo que Amílcar de Castro afirmava que o concurso seria incidente de mero acertamento.

A teoria de Alfredo Buzaid15, o processo concursal é, por sua índole, executivo cumulativo. A atividade jurisdicional de conhecimento, que por ventura possa ocorrer de forma eventual, a fim de solver a disputa entre os credores, não modifica a sua natureza executiva. Trata-se, portanto, de processo autônomo, qualificado pela acessão de credores, devidamente habilitados, após a fase de cognição eventual, segundo o princípio da :par conditio creditorum, assegurados os créditos preferências ou privilegiados.

 

Editais e impugnações

 

A publicação do edital, aliás, nada mais é do que o chamamento dos credores para a habilitação e classificação do respectivo crédito, com a finalidade de concorrerem com a realização dos bens do devedor insolvente, pela respectiva quota. Trata-se, por conseguinte, da citação dos credores para habilitação do respectivo crédito, representado por título executivo. De modo que no juízo da insolvência civil concorrerão todos os credores do devedor comum (CPC, art. 762). Até mesmo os créditos declarados em sentença, com execução em curso ou aqueles privilegiados, deverão ser reunidos no concurso universal. Isso porque a insolvência civil se origina pela ausência de bens do devedor executado passíveis de penhora, qualificada pela pluralidade de credores.

A intimação por edital, como assevera Celso Neves16, põe início a fase de cognição - atividade jurisdicional de conhecimento17 - para ser dirimido o conflito de interesses que possam surgir entre as partes. O devedor ou qualquer dos credores podem impugnar os créditos que vierem a ser habilitados18. Na medida em que cada declaração de habilitação de crédito acarretará em uma nova ação executiva concorrente (amparada pelo correspondente título) na proporção do rateio dos bens do devedor comum. Portanto, a fase de habilitação do crédito consiste em exercício do direito de pretensão à tutela jurídica19. Entretanto, deverá o credor, para satisfazer seu crédito, se submeter ao juízo universal do concurso de credores, sob pena de frustrar o seu direito emanado pelo título executivo.

A doutrina diverge sobre a necessidade de o credor ostentar o título executivo para ser habilitado no concurso de credores. Essa divergência decorre da conclusão de Pontes de Miranda20, ao estudar o direito de o credor cobrar a dívida antes do prazo estipulado no contrato, em face da abertura do concurso creditório (CC, art. 954, I), no sentido de que “a certeza e a liquidez do título não mais são exigidas aos credores que pretendem inserir-se na relação jurídica processual, como credores concursais, em sendo ‘civil’ o concurso de credores. Para o credor ingressar no concurso de credores civil o que se exige é que tenha algum título válido e eficaz. :Os que apresentam a exigibilidade como pressuposto da dívida para alguém ser admitido a concurso não meditaram o assunto”.

Entretanto, essa divergência encontra ferrenha resistência de José Frederico Marques21, Humberto Theodoro Júnior22 e Araken de Assis23, porquanto entendem estes renomados juristas que, a legitimidade ativa do credor, para o exercício de qualquer execução, inclusive para a execução coletiva contra devedor insolvente, encontra amparo no título líquido, certo e exigível, conforme imposição expressa do art. 586 do Código de Processo Civil. E não há como negar essa exigência legal.

De outro lado, faz-se necessário dizer que o conteúdo da impugnação redundará, necessariamente, com relação à habilitação do crédito e a respectiva preferência ou privilégio concedido por lei ao credor. Além de dirimir qualquer dúvida a respeito de possíveis vícios contidos no título executivo, além das argüições de nulidade, simulação, fraude ou falsidade de dívidas e contratos. Diferentemente do que ocorre com a declaração da prescrição do crédito concorrente, posto que essa argüição somente caberia ao devedor. Nunca pelo terceiro, com a ressalva da respectiva renúncia, que se causar prejuízo de terceiro, poderá ser anulada24.

A impugnação, em verdade, consiste no autentico processo de conhecimento, exercido pelo credor (legitimado material)25, possibilitando às partes e ao magistrado, o amplo debate sobre a controvérsia emergente, ultimando-se com a prestação jurisdicional constitutiva e, obviamente, recorrível. Com o trânsito em julgado desta decisão, pondo fim a habilitação e a eventuais controvérsias sobre a natureza dos créditos, possibilitando a organização do quadro geral de credores. Ato contínuo, será dado início ao procedimento de rateio do produto da alienação dos bens do devedor.

Art. 769. Não havendo impugnações, o escrivão remeterá os autos ao contador, que organizará o quadro geral dos credores, observando, quanto à classificação dos créditos e dos títulos legais de preferência, a que dispõe a lei civil.

Parágrafo único. Se concorrerem aos bens apenas credores quirografários, o contador organizará o quadro, relacionando-os em ordem alfabética.

 

Ultimado o prazo de vinte dias, para que as partes opusessem suas impugnações, sem que esse direito seja exercido, o escrivão remeterá os autos do processo ao contador para proceder na classificação dos créditos e dos títulos legais de preferência. Note-se, portanto, que a classificação dos créditos respeita o que dispõe a lei civil26, observado o princípio dapar conditio creditorum e ressalvado o direito de preferência (direito real) ou privilégio legal, :ex vi do art. 187 do Código Tributário Nacional.

Não havendo impugnações, caberá ao escrivão remeter os autos do processo ao contador, a fim de que seja organizado o quadro geral de credores, conforme o determinado pelo direito material, acima referido.

O quadro geral de credores poderá ser ordenado pela classificação do alfabeto, mas, tão-somente, se na hipótese fática os credores pertencerem à categoria dos quirografários. Entretanto, havendo credores privilegiados ou preferenciais, seria plausível que esses fossem ordenados por primeiro, conforme sua qualificação, e, posteriormente, seriam organizados os credores quirografários pela ordem alfabética27.

Nesse sentido, Pontes de Miranda28, :verbis:

Preferências. Os créditos com garantia real passam antes dos privilegiados, e hão de ser satisfeitos na ordem das inscrições: o privilégio especial prefere o geral: os créditos quirografários são satisfeitos ‘pro rata’. Cf. Código Civil, arts. 1.554-1.571.

Igualmente, o Código Civil dispõe que o credito real prefere o pessoal de qualquer espécie: o crédito pessoa privilegiado, ao simples: e o privilégio especial, ao geral (CC, art. 961), sendo os títulos legais de preferência são os privilégios e os direitos reais (CC, art. 958).

 

Para Araken de Assis29, a ordem dos créditos no concurso civil é a seguinte: (a) créditos trabalhistas: (b) despesas processuais da execução coletiva e demais débitos da massa, definidos estes no art. 124 do Dec.-lei 7.661/45: (c) créditos originários de acidente do trabalho (art. 102, § 1º do Dec.-lei 7.661/45): (d) crédito da fazenda pública (art. 186, parágrafo único, do mesmo diploma, e a preferência do crédito tributário em relação ao não tributário: (e) créditos dotados de garantia real – hipoteca, penhor e anticrese –, ressalvado, no produto da alienação dos bens gravados, os débitos da massa (art. 125 do Dec.-lei 7.661/45), e concorrendo mais de um crédito da mesma classe sobre o bem, observada a prioridade do registro da hipoteca (art. 1.422, :caput, do CC de 2.002): (f) créditos com privilégio especial: (g) créditos com privilégio geral: e (h) crédito quirografários (art. 957 do CC de 2.002)

Art. 770. Se, quando for organizado o quadro geral dos credores, os bens da massa já tiverem sido alienados, o contador indicará a percentagem, que caberá a cada credor no rateio.

 

Nesta fase processual é de se verificar a ocorrência da alienação dos bens do devedor executado, isso porque a indicação da percentagem somente seria possível no caso desta hipótese específica. De modo que sem a alienação ocorrida antes da organização do quadro de credores não haveria distribuição de percentagem destinada aos credores no rateio. Essa conversão de bens em dinheiro permite o rateio percentual que realiza o plano destinado a servir de base aos pagamentos, segundo a :par condicio creditorum30.

Ademais, no caso de existir bens do devedor que ainda não foram alienados, caberá ao juiz determinar a respectiva alienação em praça ou leilão, destinando-se o produto ao pagamento dos credores (CPC, art. 773).

Sem esquecer que se houvesse alguma impugnação, não seria crível de imputar ao contador que indicasse a percentagem que caberia a cada credor no rateio31. Essa cautela mostra-se necessária a fim de evitar a conseqüente alteração dos créditos habilitados e, por conseguinte, a modificação da cota-parte destinada a cada credor, conforme a distribuição equânime inerente à condição de credor quirografário.

Assim, inocorrida qualquer alienação dos bens da massa, assim como ausência de preferência ou privilégio atribuível aos credores, caberia ao contador, simplesmente, elaborar o quadro geral de credores.

Art. 771. Ouvido todos os interessados, no prazo de (10) dez dias, sobre o quadro geral dos credores, o juiz proferirá sentença.

 

Não havendo impugnação ou sem a necessidade de ser aprazada audiência de instrução e julgamento, no caso de produção de prova oral (CPC, art. 772, § 1º), e após a manifestação de todos os interessados, ou vencido o prazo de dez dias sem o pronunciamento dos interessados, o juiz proferirá a sentença.

Trata-se de prestação jurisdicional concernente a verificação e classificação dos créditos a serem habilitados, bem como solver as eventuais impugnações promovidas pelas partes.

Pontes de Miranda32 chama a atenção para o fato de existir dois julgamentos quanto ao concurso de credores, a saber:

...um, que concerne à entrada na relação jurídica processual (art. 761, II), e esse interessa ao devedor, e outro, que aprecia as alegações e impugnações dos credores, só entre si. Nesse, pode não ser interessado o devedor, que, por isso mesmo, não pode embargar, ao passo que pode embargar quanto ao primeiro.

Esta fase da insolvência civil prepara o momento final do procedimento concursal, isto é, o pagamento dos credores. Pagamento esse, que deverá ser estribado pelas preferências dos créditos, como também pelos privilégios legais concedidos aos credores, tangenciado, por fim, pelo critério da :par conditio creditorum, no que couber.

Art. 772. Havendo impugnação pelo credor ou pelo devedor, o juiz deferirá, quando necessário, a produção de provas e em seguida proferirá sentença.

§ 1º. Se for necessário prova oral, o juiz designará audiência de instrução e julgamento.

§2º. Transitada em julgado a sentença, observar-se-á o que dispõe os três artigos anteriores.

 

 

A impugnação referida neste artigo pode ser oferecida tanto pelo credor como pelo devedor que, se depender da produção de prova, poderá ser autorizada pelo juiz, desde que pertinente, sendo proferida sentença de imediato. Portanto, a impugnação deve atender aos interesses dos credores, sendo-lhes comum alegarem as suas preferências, bem como a nulidade, simulação, fraude, ou falsidade de dívida e contratos (CPC, art. 768). Embora, nas palavras de Celso Neves33, essa impugnação não se refere ao quadro geral de credores, mas, isto sim, de impugnação aos créditos que se refere ao parágrafo único, do art. 768.

Sem esquecer que cada habilitação de crédito corresponde a uma relação processual autônoma que terá curso concomitante em face das demais ações da mesma natureza jurídica. Na medida em que cada declaração de habilitação de crédito acarretará em uma nova ação executiva concorrente (amparada pelo correspondente título) na proporção do rateio dos bens do devedor comum. O processo assim formado, paralelamente ao de execução concursal, é processo de conhecimento e termina por sentença34.

Surgida à necessidade de produção de prova oral, o juiz deverá aprazar data para a realização de audiência de instrução e julgamento, proferindo a sentença no prazo de dez dias. O número de impugnações determinará o número de sentenças a ser proferida no juízo concursal (cumulação de pedidos concorrentes), que somente alcançarão o trânsito em julgado conforme a preclusão de cada prazo recursal.

A natureza jurídica da sentença no juízo concursal é eminentemente executiva, havendo pouca divergência na doutrina, conforme aponta Pontes de Miranda35, entre eles: Francesco Carnelutti, Virgilio Andrioli e José Alberto dos Reis, que entendiam ser a sentença de eficácia declarativa.

De se observar, por ilustrativo, o magistério de Pontes de Miranda36 com relação às definições das eficácias decisórias provenientes da execução concursal, a saber: (a) ação do credor no concurso constitui eficácia declarativa executiva: (b) ação executivas de título extrajudicial consiste em eficácia executiva condenatória: (c) :actio iudicati consiste em eficácia executiva: (d) embargos de terceiro consiste em eficácia mandamental: (e) recurso contra a abertura de concurso consiste em eficácia mandamental negativa: (f) ação rescisória da sentença de abertura do concurso consiste em eficácia constitutiva negativa.

Por fim, transitado em julgado as decisões que põe fim as impugnações, ou quando não houver reclamação ou impugnação (CPC, art. 771), será iniciado o pagamento dos credores, conforme determinação expressa do plano de distribuição do rateio, observado o percentual de cada credor sobre as alienações já ocorridas antes da formação do quadro geral de credores.

Art. 773. Se os bens não forem alienados antes da organização do quadro geral de credores, o juiz determinará a alienação em praça ou leilão, destinando-se o produto ao pagamento dos credores.

 

A alienação dos bens da massa, posteriormente a organização do quadro geral de credores, é fundamental para o bom termo do processo de insolvência civil, porquanto o pagamento dos credores – necessariamente – deverá ser efetuado em dinheiro, respeitado o quociente devido a cada credor. Mas não se pode ignorar, contudo, que o pagamento igualitário entre os credores concorrentes, deve respeitar as preferências e privilégios legais, antes assinalados, pois igualizar, na insolvência civil, significa fazer igual o prejuízo37.

Por conseguinte, essa destinação do produto da massa dos bens do devedor ao pagamento dos credores, nada mais é do que a extinção do processo concursal para aquela relação jurídica solvida, porém, na sua quota parte, e tão-somente isso. Faz-se necessário essa ressalva, porquanto esse pagamento aos credores, observado o percentual estipulado pelo quadro geral de credores, não libera o devedor imediatamente após a sua realização.

Com será visto no comentário seguinte, a efetiva liberação da obrigação assumida pelo devedor inadimplente – somente será integralmente satisfeita – após cinco anos contados do trânsito em julgado da sentença que encerrar o processo de insolvência civil. Isso porque, no caso de pagamento parcial, ficará o devedor obrigado pelo saldo (CPC, art. 774 e seguintes).

 

 

1 Alfredo Buzaid :in “Do Concurso de Credores no Processo de Execução”, Saraiva, 1952, pág. 49.

2 Ver comentário ao art. 777.

3 Alfredo Buzaid :in “Do Concurso de Credores no Processo de Execução”, Saraiva, 1952, pág.75.

4 Enrico Tullio Liebman :in “Processo de Execução”, Saraiva, pág. 193.

5 Araken de Assis :in “Manual do Processo de Execução”, Revista dos Tribunais, pág. 997.

6 Enrico Tullio Liebman :in “Processo de Execução”, Saraiva, pág. 182.

7 Enrico Tullio Liebman :in “Processo de Execução”, Saraiva, pág. 183.

8 Humberto Theodoro Júnior :in “A insolvência Civil”, Forense, pág. 19.

9 Pontes de Miranda :in “Comentários ao Código de Processo Civil”, Forense, pág. 204.

10 Enrico Tullio Liebman :in “Processo de Execução”, Saraiva, pág. 188.

11 Ver o comentário ao art. 774.

12 Alfredo Buzaid :in “Do Concurso de Credores no Processo de Execução”, Saraiva, pág. 227.

13 Enrico Tullio Libman :in “ Processo de Execução”, Saraiva, 4ª edição, 1980, pág. 177.

14 Alfredo Buzaid :in “Do Concurso de Credores no Processo de Execução”, pág. 232.

15 Alfredo Buzaid :in “Do Concurso de Credores no Processo de Execução”, pág. 238.

16 Celso Neves :in “Comentários ao Código de Processo Civil”, Forense, pág. 350.

17 Alfredo Buzaid :in “Do Concurso de Credores no Processo de Execução”, pág. 235.

18 José Frederico Marques :in “Manual de Direito Processual Civil”, Saraiva, pág. 284.

19 Pontes de Miranda :in “Comentários ao Código de Processo Civil”, Forense, pág. 339.

20 Pontes de Miranda :in “Comentários ao Código de Processo Civil”, 2ª edição, Forense, pág. 331.

21 José Frederico Marques :in “Manual de direito Processual Civil”, Saraiva, pág. 285.

22 Humberto Theodoro Júnior :in “A Insolvência Civil”, 2ª edição, Forense, pág. 332.

23 Araken de Assis :in “Manual do Processo de Execução”, 8ª edição, Revista dos Tribunais, pág. 1079.

24 Pontes de Miranda :in “Comentários ao Código de Processo Civil”, Forense, pág. 464.

25 Pontes de Miranda :in “Comentários ao Código de Processo Civil”, Forense, pág. 459.

26 Nesse sentido, Pontes de Miranda :in “Comentários ao Código de Processo Civil”, Forense, pág. 475: Celso Neves :in“Comentários ao Código de Processo Civil”, Forense, pág.352.

27 Celso Neves :in “Comentários ao Código de Processo Civil”, Forense, pág.352.

28 Pontes de Miranda :in “Comentários ao Código do Processo Civil”, Forense, pág. 482.

29 Araken de Assis :in “Manual do Processo de Execução” 8ª edição, Revista dos Tribunais, pág. 1091.

30 Celso Neves :in “Comentários ao Código de Processo Civil”, Forense, Vol. VII, pág. 297.

31 Pontes de Miranda :in “Comentários ao Código de Processo Civil”, Forense, Tomo XI, pág. 480.

32 Pontes de Miranda in “Comentários ao Código de Processo Civil”, Forense, Tomo XI, pág. 485.

33 Celso Neves in “Comentários ao Código de Processo Civil”, Forense, Vol. VII, pág. 298.

34 José Frederico Marques :in “Manual de Processo Civil”, Saraiva, pág. 285.

35 Pontes de Miranda :in “Comentários ao Código de Processo Civil”, Forense, Tomo XI, pág. 487.

36 Pontes de Miranda :in “Comentários ao Código de Processo Civil”, Forense, Tomo XI, pág. 490.

37 Pontes de Miranda :in “Comentários ao Código de Processo Civil”, Forense, Tomo XI, pág. 204.


GOMES, Carlos de Souza Gomes. Comentários aos arts. 768 a 773 do CPC - Da verificação e da classificação dos créditos. Revista Páginas de Direito, Porto Alegre, ano 7, nº 678, 24 de Novembro de 2007. Disponível em: https://paginasdedireito.com.br/artigos/todos-os-artigos/comentarios-aos-arts-768-a-773-do-cpc-da-verificacao-e-da-classificacao-dos-creditos.html
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Editores: 
José Maria Tesheiner
(Prof. Dir. Proc. Civil PUC-RS Aposentado)

Mariângela Guerreiro Milhoranza da Rocha

Advogada e Professora Universitária

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