10.03.03
| José Maria Rosa Tesheiner
Execução de sentença – Iniciativa do devedor – Consignação em pagamento
O artigo 570 do Código de Processo Civil dispõe: “O devedor pode requerer ao juiz que mande citar o credor a receber em juízo o que Ihe cabe conforme o título executivo judicial: neste caso, o devedor assume, no processo, posição idêntica à do exeqüente”.Trata-se, aí, de um caso especial de ação consignatória (Araken de Assis [1] ), cabendo, pois, invocar-se as disposições a ela relativas, quais sejam:“Art. 890 - Nos casos previstos em lei, poderá o devedor ou terceiro requerer, com efeito de pagamento, a consignação da quantia ou da coisa devida.“§ 1º - Tratando-se de obrigação em dinheiro, poderá o devedor ou terceiro optar pelo depósito da quantia devida, em estabelecimento bancário, oficial onde houver, situado no lugar do pagamento, em conta com correção monetária, cientificando-se o credor por carta com aviso de recepção, assinado o prazo de 10 (dez) dias para a manifestação de recusa.“§ 2º - Decorrido o prazo referido no parágrafo anterior, sem a manifestação de recusa, reputar-se-á o devedor liberado da obrigação, ficando à disposição do credor a quantia depositada.“§ 3º - Ocorrendo a recusa, manifestada por escrito ao estabelecimento bancário, o devedor ou terceiro poderá propor, dentro de 30 (trinta) dias, a ação de consignação, instruindo a inicial com a prova do depósito e da recusa.“§ 4º - Não proposta a ação no prazo do parágrafo anterior, ficará sem efeito o depósito, podendo levantá-lo o depositante.“Art. 891 - Requerer-se-á a consignação no lugar do pagamento, cessando para o devedor, tanto que se efetue o depósito, os juros e os riscos, salvo se for julgada improcedente.“Parágrafo único - Quando a coisa devida for corpo que deva ser entregue no lugar em que está, poderá o devedor requerer a consignação no foro em que ela se encontra.“Art. 892 - Tratando-se de prestações periódicas, uma vez consignada a primeira, pode o devedor continuar a consignar, no mesmo processo e sem mais formalidades, as que se forem vencendo, desde que os depósitos sejam efetuados até 5 (cinco) dias, contados da data do vencimento.“Art. 893 - O autor, na petição inicial, requererá:I - o depósito da quantia ou da coisa devida, a ser efetivado no prazo de 5 (cinco) dias contados do deferimento, ressalvada a hipótese do § 3º do art. 890:II - a citação do réu para levantar o depósito ou oferecer resposta.“Art. 894 - Se o objeto da prestação for coisa indeterminada e a escolha couber ao credor, será este citado para exercer o direito dentro de 5 (cinco) dias, se outro prazo não constar de lei ou do contrato, ou para aceitar que o devedor o faça, devendo o juiz, ao despachar a petição inicial, fixar lugar, dia e hora em que se fará a entrega, sob pena de depósito.“Art. 895 - Se ocorrer dúvida sobre quem deva legitimamente receber o pagamento, o autor requererá o depósito e a citação dos que o disputam para provarem o seu direito.“Art. 896 - Na contestação, o réu poderá alegar que: I - não houve recusa ou mora em receber a quantia ou coisa devida: II - foi justa a recusa: III - o depósito não se efetuou no prazo ou no lugar do pagamento: IV - o depósito não é integral.“Parágrafo único - No caso do inciso IV, a alegação será admissível se o réu indicar o montante que entende devido.“Art. 897 - Não oferecida a contestação, e ocorrentes os efeitos da revelia, o juiz julgará procedente o pedido, declarará extinta a obrigação e condenará o réu nas custas e honorários advocatícios.“Parágrafo único - Proceder-se-á do mesmo modo se o credor receber e der quitação.“Art. 898 - Quando a consignação se fundar em dúvida sobre quem deva legitimamente receber, não comparecendo nenhum pretendente, converter-se-á o depósito em arrecadação de bens de ausentes: comparecendo apenas um, o juiz decidirá de plano: comparecendo mais de um, o juiz declarará efetuado o depósito e extinta a obrigação, continuando o processo a correr unicamente entre os credores: caso em que se observará o procedimento ordinário.“Art. 899 - Quando na contestação o réu alegar que o depósito não é integral, é lícito ao autor completá-lo, dentro em 10 (dez) dias, salvo se corresponder a prestação, cujo inadimplemento acarrete a rescisão do contrato.“§ 1º - Alegada a insuficiência do depósito, poderá o réu levantar, desde logo, a quantia ou a coisa depositada, com a conseqüente liberação parcial do autor, prosseguindo o processo quanto à parcela controvertida.“§ 2º - A sentença que concluir pela insuficiência do depósito determinará, sempre que possível, o montante devido, e, neste caso, valerá como título executivo, facultado ao credor promover-lhe a execução nos mesmos autos.“Art. 900 - Aplica-se o procedimento estabelecido neste Capítulo, no que couber, ao resgate do aforamento”.A iliquidez da dívida não obsta a ação consignatória. Ensina Adroaldo Furtado Fabrício:“O falso requisito da liquidez e certeza. Nunca esteve em nenhuma disposição legal essa exigência. Na verdade, indispensável é a afirmação do autor no sentido da existência e do montante do débito. Não é exigível que ele desde logo comprove aquela existência e esse valor: nem se há de negar a possibilidade de virem a ser demonstradas no curso do processo, inclusive por testemunhos, segundo as regras comuns de direito probatório.“Aliás, com referência à liquidez, erigida que fosse à categoria de condição de viabilidade da demanda consignatória, colidiria com as próprias disposições legais que tradicionalmente põem a alegação de insuficiência do depósito entre as admissíveis como matéria da contestação. E ainda mais frontalmente colidiria com a regra, consagrada por este Código, permissiva até mesmo da complementação posterior do depósito, ante a impugnação do demandado quanto ao seu valor.“Só é aceitável o requisito da liquidez e certeza quando entendido como ônus de alegar imposto ao autor. Com efeito, este não seria admitido a propor ação consignatória relativamente ao que ele possa dever, colocando ele próprio em dúvida a existência do débito: ou ao valor que venha a ser apurado no curso do processo, e que o demandante afirme desconhecer. A oferta tem de ser precisa quanto ao seu objeto e determinada em sua quantidade – sem que para isso a dívida em si mesma precise ser líquida e certa. Divergências que surjam a qualquer desses respeitos entre as partes solucionam-se nos próprios autos da consignatória, sem o que o julgamento de mérito será impossível – consistindo esse julgamento, como consiste, na declaração de haver ou não o devedor realizado em equivalente do pagamento” [2] .Quid juris se o juiz, na sentença, constata a insuficiência do depósito, não obstante intimado o autor para complementá-lo? A sentença será de rejeição da demanda, se o juiz se convencer da insuficiência do depósito, ensinava Adroaldo Furtado Fabrício [3] . “A função da sentença, na ação consignatória”, diz Humberto Theodoro Junior, “é declarar, ou não, o depósito capaz de liberar o devedor da obrigação que tem perante o demandado” [4] .Agora, porém, temos o disposto no parágrafo 2º do artigo 899: “§ 2º - A sentença que concluir pela insuficiência do depósito determinará, sempre que possível, o montante devido, e, neste caso, valerá como título executivo, facultado ao credor promover-lhe a execução nos mesmos autos”. Ter-se-ia assim instituído hipótese de ação consignatória procedente em parte? A resposta é negativa. O credor não é obrigado a receber por partes, se assim não se ajustou (Cód. Civil, art. 314). Assim, a insuficiência da oferta real torna justa a recusa do recebimento, donde a improcedência da ação consignatória, com as conseqüências daí decorrentes, em especial as pertinentes à condenação do autor nas custas e em honorários. Havendo o juiz fixado o montante devido, superior ao valor do depósito, cabe ao credor requerer a penhora ou o arresto da quantia depositada, para impedir seu levantamento pelo consignante.A consignação em pagamento proposta pelo vencido (CPC, art. 570), constitui hipótese de puração de mora solvendi (Cód. Civil, art. 401). Não pode, por isso mesmo, implicar prejuízo para o credor vitorioso. É a razão pela qual “o incidente do art. 570 somente gerará sujeição do credor a custas e honorários de advogado, se: a) o depósito se dever a fato a ele imputável (recusa, embaraço ou dificuldade opostos ao pagamento extrajudicial): ou b) a contestação eventualmente oposta ao depósito for desacolhida pela sentença. Fora daí, as despesas do depósito são encargos do devedor sucumbente no processo de cognição” (Humberto Theodoro Júnior [5] ).[1] Manual do processo de execução.  :5. ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, n. 87, p. 281-2.[2] Comentários ao Código de Processo Civil, Rio de Janeiro, Forense, 1980, n. 24, p. 50-1.[3] Ibidem, p. 181.[4] Execução de sentença – Iniciativa do devedor – Interpretação da sentença. Revista Jurídica, Porto Alegre (299): 7-18, set/2002.[5] Ibidem.
TESHEINER, José Maria Rosa Tesheiner. Execução de sentença – Iniciativa do devedor – Consignação em pagamento. Revista Páginas de Direito, Porto Alegre, ano 3, nº 66, 10 de Março de 2003. Disponível em: https://paginasdedireito.com.br/artigos/todos-os-artigos/execucao-de-sentenca-iniciativa-do-devedor-consignacao-em-pagamento.html
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