ANÁLISE DA LITISPENDÊNCIA NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO E NO DIREITO COMPARADO
RESUMO: Trata-se de estudo sobre a impossibilidade de aplicação do instituto da litispendência no âmbito internacional, definida pelo artigo 24 do Código de Processo Civil Brasileiro, gera diversos problemas, principalmente quando se trata de competência concorrente entre países. O problema de concorrência de jurisdições gera uma manobra internacionalmente conhecida por forum shopping, que tem a exata ideia de compra de uma jurisdição mais favorável, além de abrir precedentes para que ocorra o bis in idem, decisões contraditórias e, ainda para que possibilite a desproporcionalidade de condenações dos diferentes tribunais. E mais, o artigo da legislação pátria confronta diretamente com o Código de Bustamante, internacionalmente conhecido como Convenção de Havana, a qual o Brasil é signatário, tendo sido incorporada ao ordenamento jurídico através do Decreto nº 18.871/29. Fazendo-se, assim, imperiosa a análise dos problemas ocorridos e o estudo sobre as soluções paliativas que estão sendo adotadas pelos Estados, como exemplo o forum non conveniens, adotado pelos países de Common Law, com o intuito de se abster de alguns julgamentos. Temos, ainda, a solução adotada pela União Européia que no artigo 21 da Convenção de Bruxelas determina a suspensão do segundo processo até que o tribunal, onde foi interposto o primeiro processo declare-se competente, devendo, assim, o segundo se declarar incompetente.
Palavras-chave: Litispendência: Processo Civil: Forum Non Conveniens: Forum shopping: Código de Bustamante.
ABSTRACT: This is a study on the impossibility of applying the lis pendens institute at the international level, defined by article 24 of the Brazilian Code of Civil Procedure, generates several problems, especially when it comes to concurrent jurisdiction between countries. The problem of competition between jurisdictions generates a maneuver internationally known as forum shopping, which has the exact idea of ??buying a more favorable jurisdiction, in addition to setting precedents for the bis in idem, contradictory decisions, and even to enable disproportionality of convictions from different courts. Furthermore, the article of Brazilian legislation directly confronts the Bustamante Code, internationally known as the Havana Convention, to which Brazil is a signatory, having been incorporated into the legal system through Decree No. 18.871/29. Thus, it is imperative to analyze the problems that have occurred and study the palliative solutions that are being adopted by the States, for example the forum non conveniens, adopted by Common Law countries, in order to abstain from some judgments. We also have the solution adopted by the European Union, which in article 21 of the Brussels Convention determines the suspension of the second case until the court, where the first case was filed, declares itself competent, and the second must therefore declare itself incompetent.
Keywords: Lis pendens: Civil Procedure: Forum Non Conveniens: Forum shopping: Bustamante Code.
INTRODUÇÃO
A questão de escolha de foro e de conflito de competência tem assumido uma grande importância, pois, principalmente a partir do último quarto do século XX, foi estabelecido um número elevado de cortes e tribunais internacionais[2]. E, devido a este fenômeno é que se verifica a resistência adotada pela legislação de alguns países em aceitar a litispendência internacional, ou seja, em declinar a jurisdição do seu poder judiciário em favor do poder jurisdicional de outro país[3]. E é exatamente por este motivo que Celli Junior[4] afirma que o artigo 24 do Código de Processo Civil Brasileiro é incompatível com a atual projeção do país, pois trata-se de um país o qual faz parte de um contexto irreversível de globalização e interdependência comercial e econômica.
COMPETÊNCIA E JURISDIÇÃO
Para que seja possível uma definição ampla e satisfatória acerca do instituto da litispendência é necessária uma diferenciação superficial entre jurisdição e competência. Maria Helena Diniz[5] define jurisdição como o poder de julgar, considerando a relação entre o Estado e os litigantes, enquanto competência como o poder de julgar considerando os juízes e os tribunais. Já Athos Gusmão Carneiro[6], expõe a jurisdição como forma do exercício de soberania do Estado e, competência, como a jurisdição na medida em que pode ser exercida pelo juiz. Humberto Theodoro Júnior[7] demonstra, com uma ideia compacta:
A competência é justamente o critério de distribuir entre os vários órgãos judiciários as atribuições relativas ao desempenho da jurisdição. [...] competência é apenas a medida da jurisdição, isto é, a determinação da esfera de atribuições dos órgãos encarregados da função jurisdicional.
Isto confirma a ideia que a maioria dos autores possui de que a competência é a regulamentadora interna do poder judiciário, ou seja, tem a finalidade de definir em qual órgão interno a ação será julgada, sendo apenas uma medida da jurisdição, a qual é definida pelos autores como o poder do Estado de julgar a ação. E, é exatamente isto que afasta e diferencia completamente a incidência destes dois institutos, pois um é encontrado no âmbito nacional, enquanto o outro é apenas notado em âmbito internacional.
E, é por este motivo que Theodoro Júnior[8] elucida que, quando o Código de Processo Civil, em seus artigos 21 a 24 cuida da competência internacional, está tratando, na verdade, da própria jurisdição, determinando, assim, quando pode ou não atuar o poder jurisdicional do Estado. Na verdade, o capítulo I, o qual define os limites da jurisdição nacional, está definindo quando o país deve ou pode atuar no julgamento de uma lide, determinando, assim, os limites de sua própria jurisdição.
A definição dos seus limites jurisdicionais são feitas pelos próprios países e possuem a finalidade de controlar a jurisdição, a fim de que possam garantir o resguardo da ordem jurídica, e, como consequência, proteger os interesses daqueles que estão em conflito[9]. E, é exatamente por este motivo que se diz que a jurisdição é função do Estado, que terá a responsabilidade de identificar o conflito de interesses e ver qual deles é juridicamente protegido.
SOBERANIA ESTATAL NA DETERMINAÇÃO DE JURISDIÇÃO
Como aduz Araújo[10], 'a jurisdição é um dos elementos da soberania do Estado, e só a este compete determiná-la'. Sendo assim, constitui princípio que aos Estados cabe determinar o limite da sua jurisdição, bem como sua organização judiciária.
E, devido ao não interesse dos Estados de avançar indefinidamente em sua área de jurisdição sem que possa tornar efetivo o julgamento feito pelo seus tribunais, é que, aos países, de forma soberana, cabe definir os limites da sua jurisdição, encontrando, como lembra Luiz Rodrigues Wambier[11] barreiras naturais nas jurisdições de outros Estados. E, como lembra Diniz[12] 'nenhum Estado soberano e independente exercerá jurisdição sobre outro país igualmente soberano e independente'. Sendo assim, a cada Estado cabe definir a sua organização jurídica, se responsabilizando pela definição de recursos cabíveis, formas de processo, bem como outros meios judiciais, sempre atento, como chama atenção Marcus Vinicius Rios Gonçalves[13], que o juiz brasileiro não possui jurisdição em outros territórios, exatamente por dever respeitar a soberania dos outros países.
Os países, entretanto, como esclarece Cândido Rangel Dinamarco[14] não a determinam por bondade, ou em nome de boas relações internacionais, mas por três motivos simples:
(a) impossibilidade ou grande dificuldade para cumprir em território estrangeiro certas decisões dos juízes nacionais, (b) a irrelevância de muitos conflitos em face dos interesses que ao Estado compete preservar e (c) a conveniência política de manter certos padrões de recíproco respeito em relação a outros Estados.
E, por isso, o Brasil definiu o alcance de sua jurisdição nos art. 21 e 22 do Código de Processo Civil, mas não deixou de determinar, também, em seu artigo 24 a impossibilidade da aplicabilidade da litispendência internacional. E, neste sentido, explica José Carlos Barbosa Moreira[15] que o artigo 24 teve a intenção de demonstrar a irrelevância dos efeitos dos processos intentados no estrangeiro para a nossa justiça, e, ainda completa que se a lide depender ou não perante juiz de outro Estado, nada importa aqui.
LITISPENDÊNCIA
A litispendência, conforme explicita José Joaquim Calmon de Passos[16], ocorre quando os mesmos sujeitos intentam duas ações visando o mesmo bem da vida e pela mesma causa, sendo assim exigida, para sua caracterização, uma tríplice identidade, quais sejam a identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir. Trata-se de um instituto que deve ser alegado antes de discutir o mérito, refere o art. 337 do Código de Processo Civil Brasileiro.
E assim, percebe-se, com nitidez, como opina Joel Dias Figueira Júnior[17], que a possibilidade de litispendência tem o condão de evitar julgamentos contraditórios sobre a mesma lide. Bem como opõe-se que ações idênticas tramitem simultaneamente, sendo que, em tese, deveriam levar os litigantes para o mesmo resultado.
Completa Figueira Júnior[18] que 'a litispendência é um pressuposto processual objetivo de validade extrínseco à relação processual que se caracteriza pela propositura de ação idêntica em relação a outra demanda, precedentemente ajuizada, e que ainda se encontra em tramitação', considerando a litispendência como um dos mais importantes institutos jurídicos do processo, apresentando-se não só como pressuposto de validade, mas também, devido aos diversos efeitos que produz.
Sendo assim, percebe-se claramente que o instituto da litispendência visa evitar que duas ações idênticas tramitem simultaneamente, sendo que deveriam levar os litigantes para o mesmo resultado. E assim, Vicente Greco Filho[19] identifica a litispendência internacional quando em tribunais de países diferentes, com jurisdições e ordenamentos jurídicos distintos, corre a mesma ação judicial, e, por isso, ele, assim como Alvim[20], defendem a prevalência de tratado internacional perante o artigo 24 do Código de Processo Civil.
LITISPENDÊNCIA INTERNACIONAL E O CÓDIGO DE BUSTAMANTE
Acontece que, da mesma forma que o Código de Processo Civil define a possibilidade de alegação da litispendência em âmbito nacional, este, em seu artigo 24, define sua inaplicabilidade quando se trata de sistemas jurídicos internacionais. O Brasil, entretanto, homologou a Convenção de Direito Internacional de Havana, conhecida popularmente como Código Bustamante, através do Decreto nº 18.871/29[21], que permite claramente, em seu artigo 394 a alegação de litispendência no âmbito internacional:
Artículo 394. La litis pendencia por pleito en otro de los Estados contratantes podrá alegarse en materia civil cuando la sentencia que se dicte en uno de ellos haya de producir en el otro los efectos de cosa juzgada.
Esta alegação, porém, deve ser feita apenas quando a sentença de um dos Estados deverá produzir efeito de coisa julgada em outro. Restando claro que só é possível a aplicação da litispendência quando se trata de competência concorrente entre os países, e ainda, como qualquer tratado de direito internacional, a aplicação somente é válida para os países signatários deste tratado internacional.
O que se nota dos julgados internacionais, entretanto, é o não acolhimento da litispendência, sob alegação de necessária aplicação do artigo 24 do Código de Processo Civil. E, assim como em diversos outros é simplesmente ignorada a existência do Código Bustamante, gerando relevantes impactos que causam efeitos recíprocos nas relações jurídicas internacionais, como aduz Jo[22], pois atualmente o sistema de processo civil internacional está relacionado diretamente à competitividade internacional dos países.
E, por isso, Alvim[23] defende a exceção de litispendência quando o país da jurisdição estrangeira for signatário de tratado internacional, o qual prevalecerá diante do artigo 24 do Código de Processo Civil. Já, Greco Filho[24] defende a possibilidade de alegação do instituto da litispendência apenas para os países signatários do Código de Bustamante, lembrando que necessariamente os dois países têm que ser competentes para julgar a causa e, que, não será permitida caso seja caso de competência exclusiva brasileira.
FORUM SHOPPING
Nos casos de competência concorrente entre países, que, como define Araújo[25], são aqueles em que o Brasil se declara competente, mas, ao mesmo tempo admite que a justiça de outro país também seja competente, sendo os casos relacionados no artigo 21 do Código de Processo Civil, os litigantes possuem a possibilidade de escolher o país que irão ingressar com a ação. Devido à livre possibilidade de escolha de jurisdição é que os litigantes realizam um estudo comparativo dos ordenamentos jurídicos dos países envolvidos, a fim de poder definir qual a melhor estratégia a ser utilizada para que haja um resultado mais favorável.[26]
É devido à escolha das partes pela melhor jurisdição que surge o instituto conhecido popularmente como forum shopping, que demonstra a exata ideia de 'compra de fórum', significando a escolha da parte pelo fórum, neste caso jurisdição, que possua leis que proporcionem um resultado mais favorável para si. E, por esse motivo, Harald Koch[27] diz que o instituto possui dois requisitos: a ação se tornar definitivamente controversa, ou seja, só pode ser resolvida no tribunal, e, a possibilidade dos litigantes escolherem entre diferentes jurisdições.
Cabe, inclusive utilizar parte de decisão proferida no caso inglês conhecido como The Atlantic Star, proferida pelo ministro Lord Simon Glaisdale (GLAISDALE: 1974, AC 436, 471):
'Forum-shopping' is a dirty word: but it is only a pejorative way of saying that, if you offer a plaintiff a choice of jurisdictions, he will naturally choose the one in which he thinks his case can be most favourably presented: this should be a matter neither for surprise nor indignation.[28]
A visão de Lord Simon Glaisdale sobre o forum shopping é exatamente a visão da maioria dos autores, definindo-o como um meio ardil de conseguirem vantagem no julgamento de uma lide, porém, ele adverte Glaisdale que não podemos esperar que os ligantes escolham o fórum que será prejudicial para ele. E, por isso, ele trata a escolha do fórum mais favorável como uma consequência óbvia para a concorrência de competência entre países.
E, apenas sob o argumento de forum shopping como um meio ardil, como regra, os conselhos, os juízes e os acadêmicos utilizam de forma pejorativa o termo forum shopping a fim de reprovar um requerente, que, na opinião deles, exploram injustificadamente a jurisdição de um local para que consiga afetar o processo, lembrando que este instituto se tornou popular entre os litigantes. E, no mesmo sentido é a explicação de Koch[29] que define o forum shopping internacional como o procedimento legítimo de estratégia dos litigantes para determinar qual a jurisdição mais favorável no seu caso, porém faz uma ressalva para que seja um instituto controlado a fim de evitar excessos, como condenações exorbitantes.
E, devido à isso, Araújo[30] define os Estados Unidos, país que possui como sistema jurídico o common law, como um país famoso, tendo sido diversas vezes escolhido para julgar lides, pois seus julgamentos determinam indenizações milionárias decorrentes do sistema de júri cível e do punitive damages. Sendo um dos países que mais veem sua jurisdição procurada para propositura de ações que não possuem pontos de conexão com seu foro, mas são escolhidos pelas vantagens e por não possuírem regras que impeçam sua competência para julgamento.
FORUM NON CONVENIENS
Devido a esta preferência de escolha pelos fóruns dos países que adotam o common law como sistema jurídico, estes começaram a alegar a não conveniência de fórum, mais conhecida como o instituto do forum non conveniens, que é aquele que seria inconveniente e implicaria a abstenção da justiça para cuidar da questão. E devido a este princípio, como elucida Nádia de Araújo[31], a atribuição da competência não obriga determinado país a atuar quando solicitado, restando-lhe um grau de discricionariedade para recusar a causa.
O instituto do forum non conveniens é utilizado, em sua maioria das vezes, pelos países de common law por serem, normalmente, os mais escolhidos pelos litigantes, pois possuem júri cível, determinando indenizações em valor elevado. E, como define o próprio nome o forum non conveniens é aquele que não é conveniente para o julgamento de determinada lide, normalmente porque o país considera mais adequado o julgamento por outra jurisdição, seja por ter uma dificuldade de acesso às provas, ou até, algumas vezes, por não possuir ligação alguma com a questão discutida.
SOLUÇÃO ADOTADA PELA UNIÃO EUROPEIA
Assim como os países de common law, a União Europeia também tem um meio de evitar o julgamento da mesma lide, através do artigo 21 da Convenção de Bruxelas[32]:
Artigo 21.° Quando acções com o mesmo pedido e a mesma causa de pedir e entre as mesmas partes forem submetidas à apreciação de tribunais de diferentes Estados Contratantes, o tribunal a que a acção foi submetida em segundo lugar suspende oficiosamente a instância, até que seja estabelecida a competência do tribunal a que a acção foi submetida em primeiro lugar.
Quando estiver estabelecida a competência do tribunal a que a acção foi submetida em primeiro lugar, o segundo tribunal declarase incompetente em favor daquele.
A convenção, em seu artigo 21, define que quando duas ações entre as mesmas partes e que possui identidade de pedido e de causa de pedir são interpostas em tribunais diferentes, o tribunal no qual a ação foi recebida em segunda lugar deve suspender a ação até que seja confirmada a competência do tribunal prevento. E, ainda, completa que a partir do momento que o primeiro tribunal se declara competente, o outro deve se declarar incompetente para o julgamento da lide.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL BRASILEIRO
Provavelmente pelos diversos motivos anteriormente expostos é que o nosso Código de Processo Civil Brasileiro, atualmente, traz uma ressalva sobre a litispendência internacional. A fim de substituir o artigo 90 do antigo Código de Processo Civil Brasileiro, surgiu no CPC/15 o artigo 24[33]:
Art. 24. A ação proposta perante tribunal estrangeiro não induz litispendência e não obsta a que a autoridade judiciária brasileira conheça da mesma causa e das que lhe são conexas, ressalvadas as disposições em contrário de tratados internacionais e acordos bilaterais em vigor no Brasil.
Parágrafo único. A pendência de causa perante a jurisdição brasileira não impede a homologação de sentença judicial estrangeira quando exigida para produzir efeitos no Brasil.
Percebe-se, claramente, uma ressalva no artigo 24 do Código de Processo Civil, a qual garante a aplicação de disposições contrárias contidas em tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário e, também, de acordos bilaterais. Tal modificação demonstra que houve uma pequena preocupação com o assunto, porém não pode ser considerada uma solução.
A modificação, de forma alguma, resultaria em uma solução completa para os casos de conflito de competência, uma vez que, como expõe Celli Junior[34], no Brasil o entendimento doutrinário predominante é que apenas se aplicaria o Código de Bustamante naquelas relações em que o outro país também tenha ratificado o tratado, o que afastaria sua incidência a países muito próximos como é o caso dos vizinhos Argentina, Uruguai e Paraguai, entre outros.
UNIFICAÇÃO PROCESSUAL INTERNACIONAL
A existência de diversos ordenamentos jurídicos, sem dúvida, acarreta diversos problemas, bem como podem desestabilizar e desincentivar o intercâmbio entre os envolvidos, como lembra Orlando Celso da Silva Neto[35], e, por isso, ele defende, assim como Hee Moon Jo[36], a necessidade de criação de regras de direito que possam propiciar soluções adequadas para este problema. Para Silva Neto[37], pois, a única solução aceitável parece ser a criação de regras de unificação, harmonização e/ou uniformização para que consigam garantir a certeza e a segurança jurídica.
Na visão de Jo[38], o direito processual internacional significaria, ao invés de legislar normas de processo civil unilateralmente, como ocorre hoje, no momento em que cada país define as suas regras, definir uma legislação pautada no contexto internacional com a intenção de garantir universalmente a justiça nas vidas privadas internacionais. E, ainda, sugere como meio mais adequado a criação de tratados, devendo, apenas na impossibilidade destes recorrer à iniciativa privada de cada país para criar normas objetivando a ordem internacional.
Como, atualmente, a maioria dos países, assim como o Brasil, ignoram os problemas gerados pela impossibilidade de aplicação do instituto da litispendência, improvável seria conseguir reunir os países a fim de objetivar a criação de um tratado internacional que regulamenta o processo civil internacional. Sendo assim, a única alternativa que sobra é a iniciativa privada de cada país para que seja possível criar normas internas objetivando a ordem internacional, devendo tais regras serem inseridas no ordenamento jurídico pátrio.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Cabe destacar, portanto, que, com o surgimento dos diversos novos tribunais e cortes, e, também com o advento da globalização e da interdependência comercial e econômica entre o países, surgiram inúmeros problemas nas relações internacionais entre eles, pois não existe uma legislação única que consiga regulamentar e limitar a jurisdição de cada país. E, é devido a este problema que as partes litigantes, bem como os próprios Estados, sofrem, pois além de prejudicar a parte, que muitas vezes pode ser condenada duplamente, ou ser condenada a pagar uma indenização muito mais alta e nada razoável, os Estados também sofrem, pois muitas vezes não conseguem tomar atitude alguma por ter que respeitar a Soberania Estatal do outro país.
E, com isso, a única solução vislumbrada é a criação de uma regulamentação de processo civil internacional que limitaria o poder de cada Estado e conseguiria regulamentar e definir a aplicabilidade de institutos processuais muito úteis, tal como a litispendência, sem que isso ferisse a soberania de nenhum dos dois países. Enquanto, porém, a unificação processual internacional não for possível, cabe aos próprios Estados definirem leis que consigam, de certa forma, regulamentar ou, ao menos, procurar soluções paliativas que possam ser aplicadas nestes casos.
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[1] Thiago Mancio Millis - Graduado em Direito pelo Instituto Brasileiro em Gestão de Negócios - IBGEN: Pós-Graduando em Inclusão e Direitos da Pessoa com Deficiência pelo Centro Universitário Celso Lisboa - UCL: Integrante do Grupo de Estudos Araken de Assis - GEAK. Contato: thiagomanciomillis@hotmail.com.
[2] CELLI JUNIOR, Humberto. Litispendência internacional no Brasil e no MERCOSUL. Revista Brasileira de Direito Processual, Belo Horizonte, nº 76, ano 19, p. 75.
[3] CELLI JUNIOR, Humberto. Litispendência internacional no Brasil e no MERCOSUL. Revista Brasileira de Direito Processual, Belo Horizonte, nº 76, ano 19, p. 222.
[4] CELLI JUNIOR, Humberto. Litispendência internacional no Brasil e no MERCOSUL. Revista Brasileira de Direito Processual, Belo Horizonte, nº 76, ano 19, p. 221.
[5] DINIZ, Maria Helena. Lei de Introdução ao código civil brasileiro interpretada. 9. ed. Adaptada à lei n. 10.406/2001. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 328-329.
[6] CARNEIRO, Athos Gusmão. Jurisdição e Competência: exposição didática: área de direito processual civil. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 1983, p. 3 e 45.
[7] THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil - Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Rio de Janeiro: 2007, p. 178.
[8] THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil - Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Rio de Janeiro: 2007, p. 179.
[9] SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil, volume 1. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 68.
[10] ARAUJO, Nadia de. Direito Internacional privado: teoria e prática brasileira. 4 ed. Atualizada e ampliada. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 221.
[11] WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil, volume 1: teoria geral do processo de conhecimento. 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 93.
[12] DINIZ, Maria Helena. Lei de Introdução ao código civil brasileiro interpretada. 9. ed. Adaptada à lei n. 10.406/2001. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 329.
[13] GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil, volume 1: teoria geral do processo de conhecimento (1ª parte). 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 46.
[14] DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil, Volume I. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros Editores, 2005, p. 362.
[15] MOREIRA, José Carlos Barbosa. Relações Entre Processos Instaurados, Sobre a Mesma Lide Civil, No Brasil e em País Estrangeiro. Revista de Processo, São Paulo, nº 7/8, 1977, p. 53.
[16] PASSOS, José Joaquim Calmon de. Comentários ao Código de Processo Civil, Lei 5.869 de 11 de janeiro de 1973, vol. III: arts. 270 a 331. 8ª Edição. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 265.
[17] FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Comentários ao código de processo civil: v. 4: do processo de conhecimento, arts. 282 a 331, tomo III. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, p 233.
[18] FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Comentários ao código de processo civil: v. 4: do processo de conhecimento, arts. 282 a 331, tomo III. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, p 230.
[19] GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro, volume I : (teoria geral do processo e auxiliares da justiça). 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 217.
[20] ALVIM, Arruda. Competência Internacional. Revista de Processo, São Paulo, nº 7/8, 1977, p. 25.
[21] BRASIL. Código Bustamante. Decreto nº 18.871, de 13 de agosto de 1929. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1920-1929/decreto-18871-13-agosto-1929-549000-publicacaooriginal-64246-pe.html. Acesso em: 05/09/2021.
[22] JO, Hee Moon. Moderno direito internacional privado. São Paulo: LTr, 2001, p. 207.
[23] ALVIM, Arruda. Competência Internacional. Revista de Processo, São Paulo, nº 7/8, 1977, p. 25.
[24] GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro, volume I : (teoria geral do processo e auxiliares da justiça). 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 225.
[25] ARAUJO, Nadia de. Direito Internacional privado: teoria e prática brasileira. 4 ed. Atualizada e ampliada. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 232.
[26] JO, Hee Moon. Moderno direito internacional privado. São Paulo: LTr, 2001, p. 207.
[27] KOCH, Harald. Internation Forum Shopping and Transnational Lawsuits. The Geneva Papers, 31., 2006, p. 294.
[28] 'Forum shopping' é uma palavra suja, mas é apenas um meio pejorativo de falar isto, se você oferece para o litigante uma chance de escolher a jurisdição, ele, naturalmente, irá escolher aquela que ele pensa que seu caso será mais favoravelmente julgado: isto não deveria ser uma surpresa nem uma indignação. (GLAISDALE: 1974, tradução livre nossa).
[29] KOCH, Harald. Internation Forum Shopping and Transnational Lawsuits. The Geneva Papers, 31., 2006, p. 293.
[30] ARAUJO, Nadia de. Direito Internacional privado: teoria e prática brasileira. 4 ed. Atualizada e ampliada. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 232.
[31] ARAUJO, Nadia de. Direito Internacional privado: teoria e prática brasileira. 4 ed. Atualizada e ampliada. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 233.
[32] UNIÃO EUROPÉIA. Convenção de Bruxelas de 1968. Disponível em: https://op.europa.eu/pt/publication-detail/-/publication/0e63083c-47ab-4e17-9f94-c319950e98dc/language-pt. Acesso em: 05/09/2021.
[33] BRASIL. Código de Processo Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 05/09/2021.
[34] CELLI JUNIOR, Humberto. Litispendência internacional no Brasil e no MERCOSUL. Revista Brasileira de Direito Processual, Belo Horizonte, nº 76, ano 19, p. 228-229.
[35] SILVA NETO, Orlando Celso da. Direito processual civil internacional brasileiro. São Paulo: LTr, 2003, p. 26-27.
[36] JO, Hee Moon. Moderno direito internacional privado. São Paulo: LTr, 2001, p. 207.
[37] SILVA NETO, Orlando Celso da. Direito processual civil internacional brasileiro. São Paulo: LTr, 2003, p. 30.
[38] JO, Hee Moon. Moderno direito internacional privado. São Paulo: LTr, 2001, p. 207.
MILLIS, Thiago Mancio Millis. ANÁLISE DA LITISPENDÊNCIA NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO E NO DIREITO COMPARADO. Revista Páginas de Direito, Porto Alegre, ano 21, nº 1550, 09 de Setembro de 2021. Disponível em: https://paginasdedireito.com.br/component/zoo/analise-da-litispendencia-no-processo-civil-brasileiro-e-no-direito-comparado.html?Itemid=188