Episódio 57: Primeiras Linhas de Processo Civil. 14 – Da exceção

Texto:José Caetano Pereira e Sousa e José Tesheiner

Apresentação:Júlio Jardim Tesheiner

Narração:José Tesheiner e Sophia Salerno Peres

Duração do episódio: 14 minutos e 29 segundos

Música:Julians Auftritt, de Christoph Pronegg, Klassik - Album 2008:Siciliana, de Schumann, por Marco Tezza

Edição de áudio:André Luís de Aguiar Tesheiner

Ouça o :podcast :pelo próprio site, clicando no ícone acima. :

Para baixar o arquivo em seu computador, clique com o botão direito em cima do :link :e escolha [salvar link como] ou [salvar destino como].

Comentários às Primeiras Linhas de José Joaquim Caetano Pereira e Sousa

Da exceção

Exceção é a alegação articulada do réu que exclui a intenção do autor.Em sentido amplo, exceção é defesa do réu, havendo exceções processuais, concernentes à relação processual e exceções substanciais ou de mérito.

Aqui, nas lições de Pereira e Sousa, exceções são questões preliminares, que devem ser examinadas antes do mérito, compreendendo todas as defesas processuais e algumas de defesas de mérito, como a de prescrição e a do indébito.

Recorde-se que a obra de Oskar Von Bulow, sobre as exceções e pressupostos processuais, considerada como primeira da fase científica do processo, somente veio a ser publicada em 1868.

As exceções são, ou dilatórias, ou peremptórias.Dizem-se exceções dilatórias aquelas que só tem por fim demorar a ação, e não extingui-la.Dizem-se exceções peremptórias aquelas que tendem a extinguir a ação, ou em todo, ou em parte.Sem usar a palavra “exceção”, ensina Humberto Dalla Bernardina de Pinho que é questão prévia preliminar a que decorre da formulacão de uma defesa indireta de natureza processual que impede (defesa peremptória) ou retarda (defesa dilatória) o exame do mérito da causa, sem influir, contudo, em seu teor, apresentando como exemplo da primeira a alegação de coisa julgada material e, da segunda, a alegação de incompetência absoluta. (PINHO. Humberto Dalla Bernardina de. Direito Processual Civil Contemporâneo – 1 – Teoria Geral do Processo. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 471-2).

As exceções dilatórias dividem-se em três classes porque: I, ou se opõem à legitimidade das partes litigantes, ou dos seus procuradores: II, ou à jurisdição do magistrado: II, ou ao mesmo processo.Diziam as Ordenações:As exceções dilatórias são em três maneiras: uma se põe contra a pessoa do autor, quando contra ele, se alega, que não é pessoa legítima para estar em juízo, ou contra o procurador, que não tem suficiente procuração ... ou contra a pessoa do juiz, quando é recusado por suspeito: A segunda se põe à jurisdição do juiz, quando o réu declina o seu foro por direito, ou privilégio especial, que lhe por Nós seja outorgado. A terceira se põe ao processo e bem do feito, quando o réu alega espaço à demanda, o qual lhe é outorgado por direito, ou por graça especial nossa, ou alega espaço à dívida,m dizendo que não é obrigado senão a certo dia, o qual ainda não é chegado, ou sob certa condição, que ainda não é cumprida, e outras semelhantes.

à primeira classe pertencem as exceções: I, de excomunhão: II, de falta de impetração da vênia: III, da falta de tutor, curador: IV, de espólio: V, de falso, ou ilegítimo procurador.Trata-se aqui das exceções dilatórias pertinentes à primeira classe, ou seja, exceções opostas à legitimidade das partes litigantes ou de seus procuradores.A exceção de excomunhão podia ser oposta a qualquer tempo (L. III, tit. XLIX, 2). Podia ser oposta até duas vezes. Podia ser conhecida de ofício. Sendo oposta, tinha o réu o prazo peremptório de 8 dias para comprová-la.

Do enquadramento dessa exceção entre as dilatórias extrai-se a suposição de que de alguma forma se podia suprir a falta de legitimação processual do excomungado.

Quanto à falta de vênia, recorde-se que a mulher não podia litigar sem autoridade de seu marido e o marido, a respeito de bens de raiz, sem outorga da mulher.

à segunda classe pertencem as exceções: I, de suspeição: II, de incompetência ou declinatória de foro: III, da prevenção, ou litispendência.Trata-se aqui das exceções dilatorias pertinentes à segunda classe, ou seja, exceções opostas à jurisdição do magistrado.à terceira classe pertencem as exceções: I, inepti libelli: II, da moratória: III, do compromisso: IV, do pacto de não pedir a dívida antes de tempo certo: V, da falta de implemento do contrato: IV, da excussão.Trata-se aqui das exceções dilatórias pertinentes à terceira classe, ou seja, exceções opostas ao processo.

Misturam-se, aí, uma defesa tipicamente processual, a da inépcia do libelo (diríamos, hoje, inépcia da petição inicial), com defesas substanciais: moratória, compromisso, pacto de não pedir antes de certo tempo: falta de implemento do contrato: excussão.

Compromisso, explica Pereira e Sousa, era a moratória ou concordata concedida pela maior parte dos credores. (nota 294)

A falta de implemento do contrato tinha a ver com a impossibilidade de se exigir, nos contratos bilaterais, a prestação da parte adversa antes de ser a própria. A regra encontra-se no artigo 476 do Código Civil vigente: Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro.

A excussão tinha a ver com o benefício de ordem, previsto hoje no artigo 827 do Código Civil: O fiador demandado pelo pagamento da dívida tem direito a exigir, até a contestação da lide, que sejam primeiro executados os bens do devedor.

As exceções peremptórias dividem-se em duas classes porque umas perimem a ação: ipso jure, como: I, as exceções rei judicatae: da transação: III, do juramento: IV, da solução: da prescrição: e outras só a excluem por certas e justas causas como as exceções: I, do indébito: II, do dolo: III, do medo: IV, non numertae pecuniae: V, non numeratae dotis: VI, do senastusconsulto Macedoniano: VII, do Senatusconsulto Veleiano.Em precisa lição, explicava Pereira e Sousa que a exceção rei judicatae nasce da autoridade da coisa julgada que tem a sentença para repelir o conhecimento de questão, cujo objeto seja o mesmo da que por ela foi decidida. Para ter o mesmo objeto é preciso que concorram três coisas: I, que se peça a mesma coisa que foi pedida na primeira causa: II, que seja a mesma a causa de pedir: III, que seja a mesma a condição das pessoas: isto é, que o autor intente a nova ação na mesma qualidade em que intentou a primeira, e que proponha contra o réu na mesma qualidade em que este procedia na primeira demanda.(nota 298).

A transação era igualada à coisa julgada, tendo os mesmos requisitos antes apontados.

O juramento a que se refere o texto era o decisório, como o feito na ação de juramento d’alma.

Solução era pagamento.

Pela prescrição, perdia o autor o direito de demandar.

A exceção de indébito era oponível ao autor que propusesse ação visando a reaver o que havia pago por obrigação natural, como, por exemplo, o que houvesse pago dívida prescrita.

O dolo e o medo podiam ser invocados em defesa como causas de nulidade do ato jurídico.

A exceção non numeratae pecuniae era oponível contra o credor que exibia prova literal de um mutuo, pelo devedor que alegadamente não havia recebido a quantia declarada. Destinava-se a combater a usura e obrigava o credor a fazer prova da causa da obrigação. (Eugene Petit. Tratado Elemental de Derecho Romano. Trad. Jose Ferrandez Gonzáles. Buenos Aires: Albatros, s/d.. n. 484).

O dote era uma quantia em dinheiro entregue ou prometida ao marido, em função de seu casamento com a mulher. Prescrevia em 30 anos a ação do marido para reclamar o dote. Tendo, porém, dado quitação, apesar de não haver recebido o dote, o prazo reduzia-se para dez anos, dando lugar à exceção non numeratae dotis, oponível pelo reu.

(L'action qui appartient au mari pour demander le payement de la dot à ceux qui l'ont constituée, dure trente ans, comme toutes les autres actions personnelles : mais si ayant donné quittance de la dot, quoiqu'il ne l'ait pas reçue, il est dix ans sans opposer l'exception, non numeratae dotis, il n'y est plus ensuite recevable : il en est aussi responsable envers sa femme, lorsqu'il a négligé pendant dix ans d'en demander le payement.

http://alembert.fr/index.php?option=com_content&:id=2435589. Acesso em 7/7/2014)

A exceção do senaatusconsulto macedoniano consistia na invocação da norma hoje constante do artigo 588 do Código Civil: o mútuo feito a pessoa menor, sem prévia autorização daquele sob cuja guarda estiver, não pode ser reavido nem do mutuário, nem de seus fiadores.

A exceção do senatusconsulto velleianum visava à decretação da nulidade de obrigações assumidas pela mulher em prol de outrem, como a fiança, por exemplo.

(Eugene Petit. Tratado Elemental de Derecho Romano. Trad. Jose Ferrandez Gonzáles. Buenos Aires: Albatros, s/d, n. 329 e ss.)

As exceções dilatórias devem ser propostas juntamente antes de se oferecer a contrariedade.Todas as exceções dilatórias sendo recebidas, são tratadas por contrariedade, réplica, e tréplica, a que se seguem as provas com dilação ordinária, e a decisão.As exceções dilatórias, havendo mais de uma, deviam ser oferecidas conjuntamente. Eram processadas e julgadas previamente, com resposta, réplica, tréplica, produção e provas e decisão, o que, à evidência, tornava moroso o processo. Na atualidade, a maioria dessas exceções, quando cabíveis, são tratadas como integrantes do mérito.

Essa mesma ordem se pratica com as exceções peremptórias só com a diferença que antes do seu recebimento se lhe assinam dez dias para a prova.As exceções peremptórias, exigiam uma justificação prévia, que devia ser produzida pelo réu no prazo de dez dias, “sem dar lugar ao autor para contrariar” (Ord. Liv. III, Tit. XX, § 15).Deve a exceção ser alegada pelo réu, e não pode ser suprida pelo juiz.Embora a palavra “exceção” seja eventualmente empregada no sentido amplo de “defesa do réu”, em sentido próprio só é exceção a que depende de alegação do réu, no que se distingue da “objeção”, de que o juiz pode conhecer de ofício.As exceções não tem lugar nas causas sumarias, nem naquelas que requerem pronta expedição.Essas defesas não eram admitidas? Ou, o que parece mais lógico, apenas não eram submetidas a procedimento próprio? O texto não esclarece.

 :

Compartilhe esta notícia:
Episódio 57: Primeiras Linhas de Processo Civil. 14 – Da exceção -  Texto:José Caetano Pereira e Sousa e José Tesheiner Apresentação:Júlio Jardim Tesheiner...

Editores: 
José Maria Tesheiner
(Prof. Dir. Proc. Civil PUC-RS Aposentado)

Mariângela Guerreiro Milhoranza da Rocha

Advogada e Professora Universitária

ACESSE NOSSAS REDES

Excelência em conteúdo jurídico desde o ano de 2000 | ISSN 1981-1578